Antes de aprofundar o assunto vamos entender o que significa perfil do solo. O solo é constituído, em diversas proporções, por partículas minerais de dimensões muito variadas e também por matéria orgânica resultante da transformação dos resíduos da vegetação que se instala desde o começo da meteorização da rocha. Estas frações minerais e orgânicas apresentam constituição e propriedades muito variadas e raramente ocorrem isoladas, antes interatuando entre si de modo a formar conjuntos de partículas designadas por agregados. Os espaços vazios existentes entre as partículas elementares ou agregadas constituem os chamados poros do solo, que são preenchidos por água e ar em proporções variáveis e são tão importantes para o funcionamento do solo quanto os respetivos constituintes sólidos (FONSECA, 2019).
Os elementos caracterizadores do solo resultam da atuação dos chamados fatores de formação do solo (clima, rocha mãe, vegetação e outros organismos, incluindo os seres humanos, relevo e tempo), cuja influência relativa nos processos de formação do solo varia de local para local e determina a enormíssima variedade de solos existentes (FONSECA, 2019).
De um ponto de vista morfológico, os processos de formação do solo traduzem-se geralmente na diferenciação em profundidade de diversas camadas com características distintas, às quais se dá o nome de horizontes que, no seu conjunto, constituem o perfil do solo. Estes horizontes, que podem ser observados num corte vertical efetuado num solo (Figura 1), são camadas sensivelmente paralelas à superfície do terreno, separadas umas das outras por limites mais ou menos evidentes, que se distinguem umas das outras através de características como a cor, a textura, a estrutura (agregação), a consistência e a densidade das raízes que nelas ocorre (FONSECA, 2019).
Sob os horizontes encontra-se geralmente, a partir de maior ou menor profundidade, material ainda não meteorizado que é a rocha mãe do solo, ou seja, a rocha a partir da qual se diferenciaram os horizontes sobrejacentes. Para uma caracterização completa dos diferentes horizontes e para a sua identificação e designação, são necessários dados laboratoriais. É com base na identificação e caracterização dos horizontes presentes em cada perfil que o solo é classificado de acordo com critérios definidos nos diversos sistemas taxonómicos usados para o efeito (FONSECA, 2019).
Dessa forma, a nomenclatura dos horizontes (e sub-horizontes) não é uniforme e tem variado ao longo do tempo. No entanto, a mais normalmente utilizada é chamada nomenclatura ABC. Neste sistema A é o horizonte mineral mais superficial, em geral enriquecido em matéria orgânica, B um horizonte sub-superficial resultante da alteração in-situ do material originário, da acumulação de materiais translocados de outros horizontes, ou da acumulação residual de constituintes não ou pouco móveis, e C o rególito (material rochoso alterado). Entre os horizontes e camadas principais distinguem-se ainda o horizonte E, um horizonte fortemente empobrecido em argila ou em compostos orgânicos, que foram translocados para um horizonte B, e as camadas R, que designam a rocha consolidada subjacente (FONSECA, 2019).
Perfil do solo – Perfil do solo corresponde a uma seção vertical que inicia na superfície do solo termina na rocha, podendo ser constituído por um ou mais horizontes (Figura 1).
Figura 1. Representação esquemática do perfil de solo, mostrando seus principais horizontes e camadas (LIMA; MELO, 2007).
A construção do perfil do solo é eficiente quando as práticas utilizadas no solo favorecem o crescimento das raízes, fazendo com que a absorção de água e nutrientes seja o mais efetivo possível (RICHART et al., 2005).
Em novas áreas pode-se ter vantagens quando nesses locais não havia grande movimentos de máquinas ou alto número de animais no local, o que reduz a compactação do solo aumentando os espaços disponíveis as raízes. Práticas de manejo do solo e das culturas provocam alterações nas propriedades físicas do solo, as quais podem ser permanentes ou temporárias (RICHART et al., 2005). Assim, o interesse em avaliar a qualidade física do solo tem sido incrementado por considerá-lo como um componente fundamental na manutenção e/ou sustentabilidade dos sistemas de produção agrícola (LIMA, 2004).
De acordo com Stenberg (1999) e Schoenholtz, Van Miegroet e Burger (2000), os indicadores da qualidade física do solo deveriam abranger os atributos físicos, químicos e biológicos do solo; incorporar a variabilidade das propriedades; ser sensíveis a variações a longo prazo provocadas pelas alterações sazonais; ser mensuráveis precisamente através de uma ampla variedade de classes e condições de solos; ser simples de medir; ter um baixo custo e ser adaptáveis para diversos sistemas. Singer e Ewing (2000) e Imhoff (2002) sugerem a utilização de indicadores da qualidade física do solo que incluam os atributos físicos que influenciam diretamente a produção das culturas como a magnitude com a qual a matriz do solo resiste à deformação; a capacidade do solo em fornecer adequada aeração e quantidade de água para o crescimento e expansão do sistema radicular.
Conforme Topp et al. (1997), Schoenholtz, Van Miegroet e Burger (2000) e Singer e Ewing (2000), os atributos mais amplamente utilizados como indicadores de qualidade física do solo são aqueles que levam em conta a profundidade efetiva de enraizamento, a porosidade total e a distribuição e tamanho dos poros, a distribuição do tamanho das partículas, a densidade do solo, a resistência do solo à penetração das raízes, o intervalo hídrico ótimo, o índice de compressão e a estabilidade dos agregados.
Como o perfil do solo influência na composição microbiológica do solo:
O solo tem como função o suporte aos processos da vida, ou seja, prover o suporte físico e os nutrientes para as plantas, promover a retenção e o movimento da água, suportar as cadeias alimentares e as funções reguladoras do ambiente, incluindo a ciclagem de nutrientes, a diversidade de macro e microrganismos, a remediação de poluentes e a imobilização de metais pesados (BEZDICEK, 1996).
Dentre as várias justificativas para o uso de microrganismos e processos microbiológicos como indicadores de qualidade do solo, destacam-se a sua capacidade de responder rapidamente a mudanças no ambiente do solo derivadas de alterações no manejo e o fato de que a atividade microbiana do solo reflete a influência conjunta de todos os fatores que regulam a degradação da matéria orgânica e a transformação dos nutrientes (KENNEDY; PAPENDICK, 1995; STENBERG, 1999).
Os microrganismos constituem ainda grande e dinâmica fonte e depósito de nutrientes em todos os ecossistemas e participam ativamente em processos benéficos como a estruturação do solo, a fixação biológica de N, a solubilização de nutrientes para as plantas, a redução de patógenos e pragas de plantas, a degradação de compostos persistentes aplicados ao solo, em associações micorrízicas e em outras propriedades do solo que afetam o crescimento vegetal (KENNEDY; PAPENDICK, 1995; Kennedy; Smith, 1995). Dessa forma, um solo de alta qualidade possui atividade biológica intensa e contém populações microbianas balanceadas, sendo vários os indicadores microbiológicos que podem fornecer uma estimativa da qualidade do solo.
O perfil de solo é um fator limitante para o desenvolvimento radicular e altas produtividades. O baixo desenvolvimento de raízes, torna a lavoura mais suscetível aos déficits hídricos, menor quantidade de nutrientes explorados no solo e maximiza as perdas decorrentes do ataque de patógenos.
Investir na qualidade da construção do perfil do solo é investir em altas produtividades, além da longevidade da lavoura. Dessa forma as culturas conseguem um bom desenvolvimento de raízes, o que também contribui com o melhoramento das camadas subsuperficiais e devemos sempre pensar em novas áreas como uma oportunidade de melhorar estruturalmente o solo e assim o retorno na qualidade do mesmo será uma grata consequência.
Referências:
BEZDICEK, D.F. Development and evaluation of indicators for agroecosystem health. Agriculture in Concert with the Environment ACE Research Projects Western Region, 1996. p.1991-1995.
FONSECA, Madalena. O que é um perfil de solo? Revista de Ciência Elementar, v. 7, n. 2, 2019.
KENNEDY, A.C. & PAPENDICK, R.I. Microbial characteristics of soil quality. J. Soil Water Conserv., 50:243-248, 1995.
KENNEDY, A.C. & SMITH, K.L. Soil microbial diversity and the sustainability of agricultural soils. Plant Soil, 170:75-86, 1995.
LIMA, Valmiqui Costa; MELO, Vander de Freitas. Perfil do solo e seus horizontes. O solo no meio ambiente: abordagem para professores do ensino fundamental e médio e alunos do ensino médio. Curitiba: Departamento de Solos e Engenharia Agrícola, p. 11-16, 2007.
RICHART, Alfredo et al. Compactação do solo: causas e efeitos. Semina: Ciências Agrárias, v. 26, n. 3, p. 321-343, 2005.
IMHOFF, S.C. Indicadores de qualidade estrutural e trafegabilidade de Latossolos e Argissolos Vermelhos. 2002. 104p. Tese (Doutorado em Agronomia) – Departamento de Solos e Nutrição de Plantas, Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, SP.
LIMA, Cláudia Liane Rodrigues de. Compressibilidade de solos versus intensidade de tráfego em um pomar de laranja e pisoteio animal em pastagem irrigada. 2004. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.
STENBERG, B. Monitoring soil quality of arable land: microbiological indicators. Soil and Plant Science, v.49, n.1, p.1-24, 1999.
SCHOENHOLTZ, S.H.; VAN MIEGROET, H.; BURGER, J.A. A review of chemical and physical properties as indicators of forest soil quality: challenges and opportunities. Forest Ecology and Management, Wageningen, v.138, p.335-356, 2000.
SINGER. M.; EWING, S. Soil quality. In: SUMNER, M.E. Handbook of soil science. Boca Raton: CRC Press, 2000. p.271-298.
STENBERG, B. Monitoring soil quality of arable land: microbiological indicators. Soil Plant Sci., 49:1-24, 1999.
TOPP, G.C.; REYNOLDS, W.D.; COOK, F.J.; KIRBY, J.M.; CARTER, M.R. Physical attributes of soil quality. In: GREGORICH, E.G.; CARTER, M.R. Soil quality for crop production and ecosystem health. Amsterdam: Elsevier Science, 1997. p.21-58.
TÓTOLA, M. R.; CHAER, G. M. Microrganismos e processos microbiológicos como indicadores da qualidade dos solos. Tópicos em ciência do solo. Viçosa, MG, Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, v. 2, p. 195-276, 2002.
Autores
Eng. Agr. Dra. Angélica Schmitz Heinzen
Eng. Agr. Msc. Thiago Stella de Freitas