As interações simbióticas entre o sistema radicular das plantas e alguns fungos são comumente referenciadas como associações micorrízicas. Nessas interações, o micélio do fungo colonizando a raiz se estende para o solo e absorve água e nutrientes (BARBOSA et al., 2015). Por outro lado, os fungos se beneficiam ao utilizar em seu metabolismo produtos fixados pelo processo fotossintético das plantas (WANG; QIU, 2006).
O termo micorriza foi proposto pelo botânico alemão Albert Bernard Frank, em 1885, originado do grego em que “mico” significa fungo e “riza” raízes (SOUZA et al., 2006). Cerca de 90% das plantas terrestres formam associações micorrízicas, as quais foram estabelecidas há mais de 400 milhões de anos e hoje são encontradas em quase todos os habitats no mundo (BERUDE, et al., 2015). O aumento da capacidade de absorção de nutrientes é promovido pela interação dos fungos micorrízicos com as espécies vegetais, proporcionando vários benefícios, além de aumentar a capacidade de sobrevivência das plantas no solo por meio da expansão do sistema radicular, causada pela simbiose dos fungos micorrízicos com as raízes (MOREIRA & SIQUEIRA, 2006; BRAHMAPRAKASH & SAHU, 2012).
As micorrizas foram classificadas originalmente em três grupos, de acordo com o aspecto morfológico e anatômico da colonização radicular: ectomicorriza, endomicorriza e ectoendomicorriza (GERDEMANN, 1968; LOPES et al., 1983 citados por RUSSOMANNO, 2006).
- Ectomicorriza: esse grupo se caracteriza sobretudo pela formação de uma rede fúngica (micélio) em tomo do córtex de raízes curtas e finas, principalmente na região de formação dos pelos radiculares. Este micélio exerce funções semelhantes às dos pelos radiculares e em decorrência, pode ocorrer uma redução na formação dos mesmos (Marx & Krupa 1978). Essas apresentam uma distribuição geográfica e vegetal limitada. Sua ocorrência é predominante nas regiões temperadas e frias e quase que exclusivamente em plantas lenhosas, como as dos géneros Pinus e Eucalyptus, que também são encontrados no Brasil. Os fungos ectomicorrizicos são essenciais para o crescimento e desenvolvimento destas espécies arbóreas e, consequentemente, para um aumento da produtividade de essências florestais (DE MIRANDA, 1981).
- Ectoendomicorrizas: apresentam características de ambos os grupos. Estes fungos têm uma pequena importância ecológica e poderiam ser considerados como um estado de evolução entre as ectomicorrizas e as endomicorrizas (DE MIRANDA, 1981).
- Endomicorrizas: Este grupo apresenta uma distribuição geográfica e vegetal mais ampla que os demais. Os fungos responsáveis por este tipo de associação ocorrem na maioria dos solos, principalmente nos solos tropicais de baixa fertilidade, e infectam a maioria das plantas anuais ou perenes, incluindo as de maior interesse econômico, como milho, soja, trigo, citros, café, cacau e outros (GERDEMANN 1975). São frequentemente chamadas fungos micorrízicos arbusculares (FMA), em que a penetração do micélio interno no córtex da raiz ocorre inter e intracelularmente.
Os Fungos micorrízicos arbusculares (FMA), são pertencentes ao subfilo Glomeromycotina (filo Mucoromycota). São biotróficos obrigatórios, caracterizados por estabelecerem uma relação simbiótica e mutualística às raízes das plantas (Figura 1), promovendo ganho de nutrientes como fósforo (P) e nitrogênio (N), zinco (Zn), cobre (Cu) e ferro (Fe) (SALA et al., 2022). As plantas apresentam maior tolerância a estresses ambientais (seca, metais, pragas, doenças, etc.), culminando com maior desenvolvimento vegetal e, consequentemente, maior produtividade. Além dos benefícios diretos, os FMA também geram uma série de benefícios indiretos ao ecossistema associativo.
Os efeitos nutricionais são os mais evidentes e consistentes daqueles atribuídos às micorrizas, estando relacionados diretamente ao crescimento e a produção das plantas. Este fato resulta, principalmente, da ação direta do fungo na absorção de nutrientes e indireta na fixação biológica de nitrogênio, mineralização e/ou solubilização de nutrientes da rizosfera, assim como a modificações na translocação, partição e eficiência de uso de nutrientes absorvidos pelas raízes ou micorrizas. Estudos em espécies vegetais diversas, em várias partes do mundo, mostram que plantas micorrizadas geralmente absorvem maiores quantidades de macro e micronutrientes, como também outros elementos como Br, Cl, Na, Al, Si e metais pesados (MATOS, 1999).
A simbiose micorrízica garante às espécies hospedeiras sucesso adaptativo em solos com baixa fertilidade, pois o fungo melhora a tolerância à acidez, à toxidez por metais pesados e contribui para a resistência às doenças presentes no ambiente (FARIA et al., 2017).
Seu ciclo se inicia com a germinação dos esporos, que se formam no solo ou dentro das raízes (SOUZA et al., 2011) quando fatores ambientais favoráveis são detectados pelos organismos, como por exemplo alguns compostos emitidos pelas raízes ou sementes das plantas, assim os fungos são atraídos iniciando seu crescimento e ramificação das hifas, divisão nuclear e colonização (COELHO, 2019).
A compatibilidade e especificidade entre FMAs e as plantas hospedeiras, promovem uma maior multiplicação de esporos, colonização micorrízica, crescimento de hifas extrarradiculares e produção de proteína do solo. Os FMAs também se beneficiam ao receber energia e carbono através do metabolismo fotossintético das plantas (BARBOSA et al., 2019).
Os FMA participam ativamente da formação e da estruturação do solo, atuam como importantes interventores no acúmulo de matéria orgânica (MO) do solo, estimulam a atividade metabólica de outros microrganismos do solo, conferindo maior homeostase ao ecossistema produtivo (RILLIG; MUMMEY, 2006). Os solos brasileiros, principalmente em áreas de Cerrado, têm como características serem pobres em nutrientes, sendo o fósforo um dos nutrientes mais difíceis de se trabalhar, por ser imóvel no solo, o que dificulta sua absorção pela planta. O uso crescente de fertilizantes fosfatados para corrigir o problema de baixa disponibilidade de fósforo tem um forte impacto econômico e ambiental, uma vez que os processos químicos de produção desses fertilizantes são de custo elevado em termos energéticos, além de utilizarem fontes não renováveis e finitas de energia (DE SOUZA MENDES, 2021).
O P total do solo pode estar na forma orgânica ou inorgânica, sendo que o fósforo orgânico pode contribuir com até 50% da composição total de fósforo nos solos, principalmente em sistema de plantio direto (GYANESHWAR et al., 2002). O fósforo de origem orgânica ocorre principalmente na forma indisponível de fosfato inositol (fitato) e outras como fosfomonoesteres, fosfolipídios, ácidos nucleicos e fosfotriesteres (GYANESHWAR et al., 2002), podendo se tornar disponível pela mineralização por enzimas fosfatases liberadas pelas raízes e pelos microrganismos (DE SOUZA MENDES, 2021). O conhecimento e o entendimento das interações solo-planta são cada vez mais importantes. E os FMA fazem parte dessas interações, tendo papel importantíssimo no desenvolvimento das plantas (WAKELIN et al., 2004; VASSILEV et al., 2006).
Afinidade da matriz AZOGEL® com fungos micorrízicos
AZOGEL® trata-se de uma matriz orgânica produzida a base de colágeno com elevado teor de carbono e nitrogênio orgânicos que estão disponíveis para a atividade de microrganismos presentes no solo e na rizosfera. De modo geral, o número de microrganismos presentes na rizosfera é muito maior do que em um solo não rizosférico e sua existência depende principalmente dos compostos orgânicos que a raiz exsuda para o solo. Por sua vez, a qualidade da rizosfera depende de uma alta disponibilidade de substâncias orgânicas, como por exemplo o carbono que é o principal elemento da matéria orgânica do solo. Desta forma, tanto o nitrogênio quanto os demais componentes orgânicos presentes em alta concentração no AZOGEL® contribuem positivamente para o desenvolvimento microbiano adequado na rizosfera.
Com a contribuição de AZOGEL® no desenvolvimento microbiano, entre eles, fungos micorrízicos, a relação de simbiose estabelecida entre esses microrganismos e as plantas, como já discutido anteriormente no texto, promove um maior aproveitamento de nutrientes pelos vegetais, o que irá refletir em maior desenvolvimento e produtividade das culturas.
Referências
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Autores
Eng. Agr. Dra. Angélica Schmitz Heinzen
Eng. Agr. Msc. Carolina Custódio Pinto
Eng. Agr. Msc. Thiago Stella de Freitas